| Resumo: | Partindo do enquadramento legal do direito à habitação e da persistente exclusão sociohabitacional
das comunidades ciganas em Portugal e procurando responder à questão
¿Em que medida o realojamento satisfaz as necessidades habitacionais, melhora a
qualidade de vida e potencia a integração social segundo as perceções dos residentes e
dos técnicos?¿, este estudo analisou o processo de realojamento de vinte e uma famílias
de etnia cigana para habitações sociais numa região do Vale do Sousa, no distrito do
Porto, bem como o papel de quatro técnicos municipais que acompanharam a intervenção.
Recorreu-se a um desenho qualitativo, com entrevistas semiestruturadas gravadas e
transcritas. As 25 transcrições foram submetidas a análise de conteúdo com codificação
temática assistida pelo MAXQDA. O corpus das famílias gerou ainda representações
gráficas de frequência lexical e distribuição de códigos.
Os resultados mostram benefícios inequívocos a nível de conforto físico, salubridade e
perceção de segurança. A satisfação global com a nova casa é elevada, mas
contrabalançada por desafios quotidianos: falta de arrumação, escadas em pisos
superiores, ausência de espaço exterior para atividades tradicionais (cestaria, lenha,
sucata) e uma nova pressão financeira decorrente do pagamento de renda, água e luz. As
relações de vizinhança mantêm-se fortes dentro da família alargada, mas os entrevistados
relatam vigilância e sentimentos de discriminação por parte de residentes não ciganos.
Quanto aos profissionais, estes confirmam as melhorias objetivas e reconhecem que a
fase crítica é a da sustentabilidade económica e a de mediação intercultural. Defendem
um acompanhamento de proximidade, a dispersão futura dos agregados por diferentes
empreendimentos e criação de espaços multifuncionais onde as famílias possam preservar
modos de vida e gerar rendimento.
O estudo contribui para a literatura ao reunir, num mesmo território, a voz dos residentes
e dos técnicos, revelando que o acesso à habitação, apesar do seu valor, não encerra o
processo: requer apoio financeiro gradual, gestão comunitária dos espaços comuns e
estratégias antidiscriminação para transformar a satisfação inicial em inclusão efetiva e
duradoura. |